Durante 25 anos, a biografia de Hélio Bicudo enfeitou os quadros do PT. Com o passar do tempo, o promotor tornou-se um estorvo. Em 2005, ano de Mensalão, ele achou que era hora de se desfiliar.
Bicudo, 88 anos, voltou em defesa da democracia e da liberdade de expressão. Uma reação a Lula. Acha-o diferente do Lula de quem fora vice nos anos 80, numa chapa que disputou o governo de São Paulo.
Em entrevista concedida, Bicudo declara: "sob a liderança de Lula, o Brasil pode caminhar para uma ditadura civil". Seguem algumas de suas declarações:
- A democracia está sob ameaça?
R: Acho que sim, porque o Presidente da República ignora a Constituição, se acha acima do bem e do mal e, com uma vitória que está delineada em favor de sua candidata, concentrará todos os poderes da República em suas mãos, além do apoio da maioria dos Estados e da população em geral. Com uma pessoa com esse potencial, e que não vê no ordenamento jurídico do país a maneira de estabilizar as discussões e debates, o Brasil pode caminhar para uma ditadura civil, sem dúvida.
- Depois de 25 anos no PT, imaginou que isso poderia acontecer?
R: De início, não, mas no final, achava que aconteceria essa reviravolta. Foi marcante aquela carta aos brasileiros que Lula escreveu antes da sua primeira eleição, demarcando uma posição muito mais para o neoliberalismo do que para o socialismo.
- Vê diferenças entre o neoliberalismo de FHC e de Lula?
R: Não há nenhuma diferença, porque quem comanda as decisões políticas hoje, como ontem, é o próprio capital.
- O PT indicava uma prática diferente?
R: O PT fazia uma oposição bastante forte nos governos Sarney e Fernando Henrique. A partir do governo Lula, a unanimidade popular que ele foi conquistando afastou a oposição do seu caminho. E o que aconteceu, sobre o Mensalão e outros atos de corrupção apontados, nada se fez. Quando Lula diz que é Presidente da República até sexta-feira à noite, e depois fecha a gaveta e só volta na segunda-feira, pratica crime de responsabilidade. Afinal, como Presidente, ele jurou obedecer as leis do país. E a Constituição não permite que o Presidente da República participe da campanha eleitoral como ele está participando. É crime que leva ao impeachment, mas nem os partidos políticos, nem a sociedade civil movem nenhuma pedra contra isso.
- O que esperar de Dilma?
R: Quem continuará mandando no país vai ser o Lula. Dilma diz que ela é o Lula. Então as coisas continuarão como estão, com a mesma corrupção, o mesmo manejo da coisa pública.
- Imaginava voltar às ruas em defesa da democracia?
R: A gente fica frustrado, depois de uma longa luta em prol da democracia, ver o que estamos vendo. E acho que não temos democracia, até pela maneira pela qual se conduz a vida pública, onde um grupelho toma conta do governo, pondo nele seus parentes, seus amigos... NÃO É O GOVERNO DO POVO! Veja a própria Constituição do STF, onde não se fez uma consulta maior para a escolha dos Ministros. Ela foi pessoal, feito pelo próprio Presidente. Leis passam na Câmara e no Senado por atuação da Presidência da República, que transformou o Legislativo em algo sem a menor expressão. [...]. Quem manda no país, passa por cima das leis é ele, Lula. Vai eleger a Presidenta que fará o que ele quiser.
- Como vê Lula?
R: Um homem inteligente, que poderia usar essa inteligência para implementar e fortalecer a democracia no país, mas optou por incrementar o poder pessoal. [...]. Ele sempre mandou no partido, afastou as lideranças que pudessem competir com ele. É o dono, sente-se acima do bem e do mal.
- Sobre os escândalos e o 'eu não sabia':
R: Ele sabia de tudo, deixou as coisas escaparem. A oposição não atuou e, hoje, chegamos onde estamos.
- Incompetência da oposição?
R: Foi inexistência de oposição.
- Sobre a saída do PT, em 2005:
R: Saí porque achei que o partido não estava trilhando a estrada que havia traçado no seu nascedouro. Ele deixou de representar o povo. Pode até ter o voto do povo, mas representa os interesses daqueles que o comandam.
- Lula e a imprensa:
R: Olha, Lula vive dizendo que a imprensa o prejudica. Eu acho que é o contrário. [...]. A imprensa tem ajudado Lula e seus candidatos. Você não pega um jornal, um programa de televisão, que não exiba um retrato dele. O povo não vê o que está escrito além da manchete. Funciona como propaganda.
- Lula e a popularidade:
R: Mis-en-scène. Com tudo isso, o que o Brasil conseguiu, do ponto de vista internacional? Zero. A questão da popularidade não tem relação com a eficiência. Olha o caso do Irã, tem maior vergonha que isso?! Nossa política externa é péssima. O Brasil não conseguiu colocar uma pessoa em cargo relevante no conceito internacional. Em matéria de Direitos Humanos, botaram lá em Genebra uma pessoa que jejuna nessa área.
- O 'ato contra o golpismo midiático', com CUT, UNE, movimentos sociais e políticos governistas:
R: Lula sempre diz que há uma revolução midiática para retirá-lo do poder. Os pelegos dele é que fizeram o movimento em contrário ao nosso.
- O manifesto 'pró-liberdade de expressão':
R: Ontem, mais de 20 mil pessoas já haviam assinado nosso documento. A semente foi plantada, e agora depende da sociedade. Porque o problema também é de pós-eleição. Repetindo o que já foi dito: se você não vigia, não tem democracia. Deve-se vigiar permanentemente quem governa o país, para que não haja desvios. Seja quem for eleito, independentemente do partido político.
- Vê méritos neste governo?
R: A questão é: o que o governo pretende com sua atuação? Para mim, só autoritarismo.
- O convívio com Lula:
R: Sim, mas os tempos mudaram completamente. Ele acabou com as lideranças do partido, e lançou uma pessoa que nem era do partido, tradicionalmente, à presidente. Hoje o PT não tem diferença nenhuma dos outros partidos.
Vale refletir, é este tipo de governo que queremos para nossos filhos, netos, e para nós mesmos?
Nenhum comentário:
Postar um comentário